Pular para o conteúdo principal

Maçã do amor

Como todas as pessoas uma Contadora de Histórias também tem seus dias de tristeza, mas ela sabe que eles passarão e que se transformarão em histórias de sua própria vida, caminhos já conhecidos e algumas cicatrizes que mostram que ela também é uma guerreira, apesar de usar as palavras como arma.
Em um desses dias cheios de tristeza e escuridão, em que a Contadora olhava para fora de si e não via nenhuma cor além da cinza (ela por dentro também estava cinza), apareceu em sua frente, de forma inesperada, a cor vermelha (sua preferida) em forma de maçã do amor.
Quem a trazia era um menino magro e pequeno, com não mais de dez anos. Enquanto a Contadora lutava contra as lágrimas que ela sempre detestou derrubar, o Menino Sem Nome apareceu.
"_Moça, quer uma maçã do amor?"
"_Não, obrigada."
"_ A senhora tá triste moça?
"_Não, não estou não."
"_ Tá sim moça, dá pra perceber. Fica assim não moça, de noite tudo é ruim, mas amanhã é um dia novo e tudo passa."
"_Quanto é a maçã?"
"_ Dois real moça, vai querer?"
"_Vou"
"_ Tó moça. E num fica triste não. Amanhã é um otro dia"
"_Obrigada, como é mesmo seu nome?"
Mas o Menino já tinha ido embora. A Contadora ficou parada, sentada em um banco com uma sensação estranha de sonho e uma maçã do amor nas mãos.
Alguns dias depois quando a Contadora andava pela cidade ainda com a tristeza como companheira avistou novamente o Menino Sem Nome com um tabuleiro de maçãs do amor, dessa vez ela foi até ele e antes que chegasse ele a reconheceu.
"_ Oi moça, a senhora por aqui? Vai querer otra maçã?"
"_Vou sim, ainda é dois reais?"
"_É moça, mas pra senhora faço um e cinquenta. Tá melhor moça?"
"_ Estou sim, obrigada."
"_ Mas inda tá triste né? Mas não se preocupa não, amanhã é otro dia di novo e depois otro...
Quando a senhora percebê nem vai lembra porque tava triste. E se for por causa de amor, a maçã adoça a vida, moça."
A Contadora não conseguiu evitar um sorriso.
O Menino Sem Nome pegou uma das maçãs, a maior e mais bonita e deu para a Contadora.
"_Obrigada. Eu ainda não sei seu nome"
Mas o menino já ia longe.
A Contadora de Histórias passou muitas vezes pelos lugares em que havia visto o Menino Sem Nome, mas, nunca mais o encontrou. Queria agradecer e dizer a ele que ele estava certo, que o tempo é um remédio bom demais e que agora, muitos anos depois, ela mal se lembrava porque estava tão triste naqueles dias. A única coisa de que ela se lembrava perfeitamente era do gosto daquelas maçãs do amor.
Se não fosse por isso a Contadora poderia jurar que o Menino Sem Nome era um desses anjos que descem à Terra de vez em quando para mandarem um recado e dissiparem a escuridão.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A fada Sabrina

Era uma vez uma menina que acreditava em contos de fadas. Ela acreditava que todas as meninas eram princesas e que os príncipes eram homens valentes e destemidos, que salvavam as donzelas em perigo e assim os dois viveriam felizes para sempre. Em sua cabeça, ela era uma princesa, no entanto, foi batizada com nome de fada: Sabrina. O tempo passou e a menina cresceu. Vaidosa e delicada enfeitava-se com pedras brilhantes e cores da moda, os olhos castanhos sempre maquiados, os cabelos ruivos parecendo fogo brando emoldurando o rosto de aparência sempre jovem e com sardas, a princípio renegadas, mas que aumentavam sua beleza. Beijou alguns sapos na esperança de que eles se transformassem em lindos homens, mas, contrariando as histórias, na vida real sapos são sempre sapos. Um dia a princesa com nome de fada conheceu a contadora de histórias, jamais duas pessoas foram tão diferentes. A contadora de histórias já havia conhecido algumas princesas e ela não se parecia com uma. Lembrava mais um

A Negociação

Eles estavam sentados em uma mesa no canto mais reservado do estabelecimento. O lugar era um bar simples  mas limpo, pouca iluminação, apenas o suficiente para enxergar o rosto de alguém que se sentasse perto. Claro que eles não estavam perto demais. Ela usava um vestido de linho branco um pouco acima do joelho; elegante e discreto para a ocasião. A cor neutra da roupa contrastava com o vermelho escuro dos cabelos.  Ele usava terno e gravata, mostrando que era um homem de negócios.  _Você é menos assustador do que eu imaginava. A Ruiva realmente esperava alguém mais sombrio do que aquele homem de cabelos negros e olhos acinzentados.  _ Você é mais bonita do que eu me lembrava. -  Ele sabia quem ela era, mas, realmente andava tão ocupado com os negócios que, às vezes, deixava passar alguns detalhes.  _ Mas, eu preferia seu cabelo na cor natural. Castanho não é? A raiz já está aparecendo - disse O Homem e em seguida se arrependeu. Apesar das circunstâncias não era educado de s

O encanto de Dirty Dancing

Tenho 31 anos e quando assisti ao filme Dirty Dancing pela primeira vez deveria ter uns 13 ou 14. Na cena final, a clássica cena de dança, voltei a fita (é, naquela época era fita) umas 15 vezes em apenas uma noite. A partir daquele momento o estrago estava feito e pode ser resumido em alguns tópicos: 1º Eu estava irremediavelmente apaixonada pelo Patrick Swayze (tanto que no dia em que ele morreu usei preto e recebi inúmeros e-mails de amigos que sabiam de meu amor platônico); 2º Todas as vezes em que eu via algum canal reprisando o filme, parava como que hipnotizada na frente da TV e só saía após a cena final (a da dança, claro); 3º Não contabilizei ao certo mas, nesses quase vinte anos que se passaram desde a primeira vez que assisti à película, já vi a última cena mais de 300 vezes; 4º Ele foi, é e, possivelmente, continuará sendo o meu filme favorito, de todos os tempos. 5º Tenho todas as edições comemorativas, com cenas extras, deletadas, testes dos atores e tudo o mais que tenho